Justiça de SP arquiva pela 2ª vez investigação sobre bebê que morreu após passar mal na Colmeia Mágica em 2010

Segundo arquivamento é de agosto. Primeiro foi em 2013. Heloisa Teodoro tinha 3 meses quando morreu. Polícia havia reaberto caso após donas e funcionária de escolinha serem condenadas por torturas e maus-tratos contra 9 alunos. Polícia apura mais 34 denúncias.

A Justiça de São Paulo arquivou pela segunda vez o inquérito policial que investigava o caso de uma bebê que morreu após passar mal em 2010 na Escola de Educação Infantil Colmeia Mágica. Este segundo arquivamento ocorreu em 3 de agosto de 2023. O primeiro havia sido em 2013.

Heloisa Vitoria Teodoro tinha pouco mais de 3 meses de vida quando morreu, em 7 de maio de 2010. Ela teria parado de respirar no berçário da escolinha particular, na Vila Formosa, Zona Leste da capital. A criança foi socorrida de carro por Roberta Serme, uma das donas da Colmeia Mágica, e levada até o Hospital São Luiz, no Tatuapé, onde a morte foi constatada. A bebê já teria chegado morta ao local.

O caso foi registrado à época como “morte suspeita” a esclarecer no 30º Distrito Policial (DP), no Tatuapé. A investigação para saber a causa da morte foi feita pelo 41º DP, Vila Rica.

Segundo disse ao g1 no início deste ano a cabeleireira Isabel Cristina Gardão da Silva, mãe de Heloisa, o laudo necroscópico apontou è época que a causa foi “asfixia mecânica por agente físico”. Mas de acordo com o Ministério Público (MP), o laudo concluiu que ela morreu por “asfixia por broncoaspiração”.

Ainda de acordo com a mãe da bebê, mesmo diante da suspeita de que Heloisa teria sido asfixiada, a polícia não investigou isso. E decidiu arquivar o inquérito que apurava a morte dela. Cristina, como prefere ser chamada, contou ainda que a alegação dada pelos policiais à época foi a de que não encontraram provas. E de que a Justiça arquivou o caso em 2013 “por falta de provas”.

Donas e funcionária condenadas

Em março de 2022, quando o g1 revelou que a Colmeia Mágica era investigada pela Polícia Civil por suspeita de tortura e maus-tratos contra alunos da escola, Cristina acionou suas advogadas para pedirem à Justiça a reabertura do caso da morte de sua filha.

No ano passado, vídeos e fotos que circulavam nas redes sociais mostravam nove crianças (sete meninos e duas meninas) chorando, com os braços imobilizados, amarrados com lençóis, presos a cadeirinhas de bebês dentro do banheiro da escolinha. As imagens tinham sido feitas por ex-funcionárias da Colmeia. Os crimes ocorreram entre dezembro de 2021 e março de 2022. As vítimas tinham de 1 ano a 5 anos de idade à época.

Em fevereiro de 2023, as proprietárias da Colmeia Mágica, Roberta e Fernanda Serme, respectivamente diretora e coordenadora da escolinha, e Solange Hernandez, funcionária de lá, foram condenadas pela Justiça como as responsáveis por torturas e maus-tratos contra os alunos. O método de amarrar as crianças, conhecido na escolinha como “charutinho”, funcionava como castigo para conter alunos desobedientes.

Roberta recebeu pena de 49 anos, 9 meses e 10 dias de prisão em regime inicial fechado, e 1 ano e 4 meses de detenção no semiaberto. Fernanda foi punida com 13 anos e 4 meses de detenção no semiaberto.

Solange foi condenada a 31 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 8 meses de detenção em regime semiaberto. Ela, no entanto, continua em liberdade.

Polícia reabriu caso sobre morte

Em março de 2023, o Ministério Público pediu para a polícia paulista reabrir o mesmo inquérito sobre a morte de Heloísa, que havia sido arquivado em 2010. A Justiça concordou. E a Central Especializada de Repressão a Crimes e Ocorrências Diversas (Cerco) da 8ª Delegacia Seccional passou a investigar novamente o que matou a menina, se houve algum crime ou não.

Mas, diferentemente de 2010, quando o caso foi investigado como “morte suspeita” a ser esclarecida, a polícia passou a apurar dessa vez se Heloísa foi vítima de “homicídio qualificado” (assassinato intencional cometido por recursos que o tornam mais grave).

Em resumo, a Promotoria queria saber se a bebê também havia sido torturada ou sofrido maus-tratos como os outros alunos de 2021 e 2022 e que apareceram nas imagens da web. E se essa violência lhe causou a morte ou contribuiu para ela.

Mas como a polícia novamente não encontrou durante a investigação indícios de que a criança morreu em decorrência de um crime, o caso foi relatado ao Ministério Público, que por sua vez pediu mais uma vez o arquivamento dele à Justiça.

O g1 procurou a mãe de Heloísa e um das advogadas dela para comentarem o assunto. Elas disseram desconhecer a decisão judicial que arquivou novamente o inquérito sobre a morte da criança. A reportagem aguarda algum posicionamento.

No ano passado, Cristina havia dito ao g1 que um documento do Hospital São Luiz informa que sua filha “chegou sem vida ao serviço” médico.

“O laudo apontou que ela foi asfixiada. Não entendo porque a polícia deixou de apurar isso”, falou Cristina ao g1 em 2022. “Acredito que Heloísa morreu dentro da escolinha. Ela já estava morta quando foi levada pela diretora ao hospital”.
34 novas denúncias contra escola

A Polícia Civil de São Paulo quer interrogar novamente as donas da Colmeia Mágica, dessa vez pela suspeita de que elas possam ter torturado e maltratado mais 34 crianças (20 meninos e 14 meninas) que estudavam no local.

Esse é o segundo inquérito contra a escola particular da Zona Leste da capital paulista. Ele foi aberto em junho de 2022 pela polícia a pedido do Ministério Público. Ainda não há previsão de quando Roberta e Fernanda Serme, respectivamente diretora e coordenadora da escolinha, serão ouvidas.

Esses novos casos chegaram ao conhecimento da investigação pelos pais e responsáveis delas, que relataram ter notado lesões e mudanças de comportamento nos filhos.

As irmãs Serme, que também são sócias da Colmeia Mágica, estão presas atualmente por causa do primeiro inquérito envolvendo a escola. Elas foram condenadas por torturar e maltratar outros nove alunos.

Ainda não há previsão de quando as irmãs Serme serão ouvidas pela Cerco da 8ª Delegacia Seccional. Como estão detidas no interior do estado, provavelmente serão interrogadas por carta precatória enviada a outra delegacia. Essa unidade policial então ouviria as duas na prisão.

Inicialmente a investigação não tem planos de ouvir Solange, funcionária da escola, que também foi condenada no primeiro inquérito.

A Promotoria quer saber, por exemplo, se a delegacia consegue esclarecer nesta nova investigação se as duas donas e a funcionária da Colmeia Mágica tiveram também a ajuda de professoras em supostas torturas e maus-tratos contra as crianças.

Além de Roberta, Fernanda e Solange, professoras da escolinha também serão investigadas pela polícia para saber se tiveram algum envolvimento. Até o momento, não há relatos de envolvimentos das educadoras.

A Colmeia Mágica havia sido fundada em 2002 e atendia crianças de 0 a 5 anos, do berçário ao ensino infantil. Atualmente está fechada. O g1 não conseguiu localizar as defesas das irmãs Serme e de Solange para comentarem o assunto até a última atualização desta reportagem.

O que dizem as donas e funcionária

Roberta chegou a confirmar em seu depoimento à polícia que os vídeos foram gravados na sua escola e que as crianças que aparecem lá são seus alunos. Mas negou que as amarrasse ou ordenasse a alguém para amarrá-las. Disse ainda que desconhecia quem teria feito isso. Mas desconfiava que as cenas pudessem ter sido montadas por alguma funcionária insatisfeita para prejudicar ela e sua irmã.
Fernanda também se mostrou surpresa com os vídeos quando foi ouvida na delegacia.
Solange também negou ter cometido algum crime. Além de acusar Roberta de “embalar'” as crianças, a funcionária falou à polícia, e em entrevista à TV Globo e ao g1, que as professoras da Colmeia Mágica eram orientadas pela diretora a fazer o mesmo “procedimento”. Ela ainda falou que não ajudou a patroa a amarrar os alunos. E negou que tivesse jogado uma coberta na cabeça de uma criança, a sufocando.
 

By Alessandra Gomes

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