‘Me parece que está maduro para poder votar’, defende Nunes sobre texto do Plano Diretor de São Paulo

Prefeito da capital paulista falou nesta segunda (26) sobre a expectativa para votação na Câmara Municipal e minimizou críticas: ‘Não vai ter em uma cidade desse tamanho, numa cidade-país, o consenso de 100% de todo mundo’. Mais de 160 entidades da sociedade civil e grupos de urbanistas se posicionaram contra o projeto.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), avaliou como maduro o texto do novo Plano Diretor da capital paulista, que tem expectativa de ser votado na Câmara Municipal, nesta segunda-feira (26), após adiamentos. Especialistas apontam que as mudanças podem trazer mais trânsito, imóveis mais caros e menos árvores na cidade.

“Me parece que está maduro para poder votar. As discussões foram bastante intensas e evidentemente você não vai ter numa cidade desse tamanho, numa cidade-país, o consenso de 100% de todo mundo”, disse Nunes, em entrevista à GloboNews.
O texto proposto pelo Executivo sofreu mudanças durante as discussões com os vereadores, como nos eixos de transporte, no Mirante de Santana e no Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano, o Fundurb.

Durante a entrevista, o prefeito minimizou as críticas feitas ao texto, ao dizer que “sempre vai ter alguém com uma posição de um lado, outra de outro, todas legítimas”, e destacou três pontos da mudança.

“Queria só ter essa oportunidade de que as pessoas possam pensar nesses três pontos: morar perto do transporte, distensionar a pressão para construção em áreas de proteção e de que a gente tenha que combater o déficit habitacional que na análise mais econômica é de 400 mil unidades habitacionais”, destacou Ricardo Nunes.

Mais de 160 entidades da sociedade civil e grupos de urbanistas assinaram uma carta com críticas ao texto substitutivo do Plano Diretor Estratégico (PDE) da cidade de São Paulo.

Entre os apontamentos, estão:

Possibilidade de prédios mais caros próximos às zonas de transporte coletivo;
Previsão de aumentar as áreas da cidade em que são permitidos prédios mais altos;
Mais vagas de garagem;
Falta de estudos que justifiquem as mudanças propostas;
Possibilidades de prédios maiores nos miolos de bairros, que ficam longe dos eixos de transporte público;
Substituição de bairros históricos por quarteirões tomados por prédios.
Especialistas que conversaram com o g1 disseram que as consequências práticas dessas mudanças são diversas:

Mais trânsito;
Supressão de áreas arborizadas;
Supervalorização de imóveis;
E outros pontos que julgam importantes.

Falta de justificativas
Joyce Reis, diretora de Políticas Públicas do Instituto dos Arquitetos do Brasil de São Paulo (IAB-SP), destaca que as propostas apresentadas no texto substitutivo do Plano Diretor não têm as justificativas necessárias para se tornarem lei.

“São coisas muito novas, num curto espaço de tempo, sem justificativa. É péssimo tecnicamente e politicamente, porque não tem avaliação que justifique e não tem estudos que mensurem o impacto”, afirmou.
Já a arquiteta e urbanista Paula Freire Santoro, coordenadora LabCidade, da Universidade de São Paulo (USP), aponta que o projeto não atinge seu devido objetivo:

“Tem sido um instrumento de regulação do mercado imobiliário. Ele está muito distante da cidade real — ele não planeja o bairro, não conhece os problemas da população mais pobre, não pensa como vai ser a chegada de infraestrutura nos bairros que não tem.”
Prédios mais altos nos eixos de transporte
Atualmente, prédios mais altos podem ser construídos num raio de até 600m das estações de trem e metrô;
O texto substitutivo criticado amplia esse raio para 700m;
Na versão anterior, a distância era de 1.000m.
Prédios mais altos nos miolos de bairros
Outro ponto trazido pelo texto substitutivo que é alvo de críticas é o aumento do coeficiente de construção nos miolos de bairros, que são as áreas fora dos eixos de estruturação — normalmente, bairros residenciais com prevalência de casas.

Atualmente, as construtoras podem fazer prédios com área útil duas vezes maior que a área do terreno;
O texto do substitutivo amplia o coeficiente para três vezes o tamanho do terreno.
De acordo com Joyce, esse tipo de verticalização — em áreas que não suportam muito adensamento — pode levar a ruas mais estreitas e um bairro com uma quantidade muito grande de pessoas e de carros.

Mais trânsito e menos árvores
Paula Santoro ressalta que a verticalização proposta pelo texto substitutivo privilegia o uso do carro mesmo nos eixos de transporte.

Segundo ela, a lei anterior tinha o objetivo de concentrar o adensamento construtivo próximo de transportes de alta capacidade e adensar com mudança de modal: “Eu vou morar perto do Metrô, não vou ter carro”, exemplificou.

“Isso ajuda a cidade no congestionamento e em termos de poluição e qualidade do ar, saúde como um todo”, apontou.
“Agora, essa verticalização vai poder acontecer em qualquer lugar, ou seja, reforçando os velhos modos individuais, motorizados, que estruturaram a nossa cidade dos carros”, afirmou.

Joyce Reis diz que outro impacto pode ser a mudança da paisagem dos bairros:

“Lugares que tinham uma morfologia, uma forma das casas, de repente, tudo passa a virar prédio. Aí você mexe na insolação, na quantidade de árvores”, explicou.

Apartamentos mais caros

Paula Santoro informou que São Paulo produziu 100 mil unidades de habitação com preço de até R$ 350 mil entre 2014 e 2019;
No entanto, apenas 15% (15 mil) dessas unidades foram feitas nos eixos;
E grande parte das unidades produzidas nos eixos eram pequenas e com metro quadrado caro.
O que diz a Prefeitura de São Paulo
Em nota, a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), disse que reafirma que o Município realizou um processo participativo amplo, democrático e transparente para discutir os ajustes no Plano Diretor.

“Desde 2014, a população pode acompanhar pela internet a aplicação do Plano Diretor pela plataforma de monitoramento do PDE no site Gestão Urbana. Ela foi desenvolvida pela Prefeitura para dar transparência e informar sobre o andamento do Plano Diretor, disponibilizando dados para diversos indicadores.

Durante a Revisão Intermediária, a Prefeitura também criou um site específico para o processo revisional e, a partir dele, a população pode se informar, em tempo real, sobre agenda de reuniões, relatórios e documentos produzidos pelo Município para esclarecer e subsidiar os debates sobre os ajustes no Plano Diretor.

Além disso, em 329 dias de Revisão no âmbito do Executivo, foram realizadas 91 atividades participativas, entre reuniões, oficinas, audiência públicas, consultas on-line e visitas distribuídas no território das 32 subprefeituras, que resultaram em mais de 12 mil contribuições. Todo esse trabalho de mobilização e participação foi reconhecido pelo Ministério Público de São Paulo.

O envio do Projeto de Lei à Câmara Municipal, em março, foi a consolidação de todo o processo revisional por parte do Município e que resultou em propostas de ajustes para o Plano Diretor. Esse texto segue em discussão no âmbito do Legislativo”.

 

By Alessandra Gomes

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