Defensoria Pública pede que Justiça obrigue governo de SP a instalar câmeras corporais nos policiais que atuam na Operação Escudo

Órgão entrou com ação civil pública com a ONG Conectas Direitos Humanos na segunda-feira (4). Defensoria pede que, no caso de impossibilidade de atendimento, que “a operação seja imediatamente suspensa, sob pena de aplicação de multa diária”.

A Defensoria Pública de São Paulo e a ONG Conectas Direitos Humanos entraram com uma ação civil pública na segunda-feira (4) com pedido de tutela antecipada para que a Justiça obrigue o governo de São Paulo a instalar câmeras corporais nos policiais militares e civis que atuam na Operação Escudo, na Baixada Santista.

Segundo o órgão, no caso de impossibilidade de atendimento, que “a operação seja imediatamente suspensa, sob pena de aplicação de multa diária”.

Na ação, a qual g1 teve acesso nesta terça-feira (5), a Defensoria Pública alega que no dia 30 de julho já foi acionada pela Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo para acompanhar a operação, já que havia sete ocorrências de morte em decorrência de intervenção policial com, no mínimo, nove vítimas fatais.

Desde então, ofícios foram enviados à Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo pedindo esclarecimentos, afirmou a Defensoria. Ao todo, foram cinco docmentos encaminhados. Veja abaixo o resumo:

31/07: ofício referente à solicitação de esclarecimentos sobre a Operação Escudo.
02/08: ofício encaminhado em complementação, no qual solicitou que sejam utilizadas câmeras corporais no uniforme de todos os policiais militares e civis envolvidos na Operação Escudo para que as abordagens sejam capturadas e passem por controle pelas autoridades competentes;
04/08: ofício referente à solicitação de informações sobre as investigações das mortes decorrentes da Operação Escudo;
08/08: ofício referente à manifestação de policiais militares nas redes sociais em relação à Operação Escudo;
18/08: reiteração dos ofícios enviados dia 31 de julho e 4 de agosto.
Contudo, a Defensoria Pública afirma que mesmo com respostas em parte dos ofícios, não foi oficialmente informada sobre quantos e quais agentes da Operação Escudo estão ou deveriam estar utilizando câmeras nos uniformes.

Além disso, não teve acesso aos inquéritos para a apuração das mortes decorrentes de intervenção policial e, como consequência, não teve acesso aos laudos e demais evidências produzidas neste âmbito.

“A solicitação de compartilhamento das imagens das câmeras corporais utilizadas pelos policiais nelas envolvidos não foi respondida pela SSP até o presente momento”, alegou o órgão, na ação civil.

Pedido
A ação aberta pela Defensoria solicita, principalmente, que o estado de São Paulo seja condenado à utilização de câmeras corporais no uniforme de todos os policiais militares e civis envolvidos nas Operações Policiais realizadas nas cidades de Santos e Guarujá para que:

“ações ostensivas, abordagens policiais, cumprimentos de mandados judiciais, ordens de prisão em flagrante, outras medidas que impactem a liberdade ou a integridade física, mental ou patrimonial de indivíduos ou coletividade sejam capturadas, armazenadas, atendendo a todos requisitos de cadeia de custódia, e passem por controle pelas autoridades competentes”.
Além disso, foi solicitado também que cumpra, na forma e no prazo estabelecidos, as requisições e solicitações de informações da Defensoria Pública, disponibilizando acesso às informações necessárias para a prestação de assistência jurídica às vítimas e seus familiares.

O órgão também pede que sejam disponibilizados “os metadados das imagens já capturadas no decorrer da Operação Escudo pelas câmeras corporais utilizadas por policiais militares”.

“Por fim, requer-se a condenação do réu em verbas sucumbenciais e honorários, a serem destinados ao Fundo da Escola da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Atribui-se à causa o valor de R$ 500 mil para fins de alçada”, finaliza a ação.

Tempo indeterminado

A Operação Escudo, deflagrada pela Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP), começou no dia 28 de julho, um dia após a morte do soldado das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Patrick Bastos, no Guarujá.

Inicialmente, o governo tinha dito que ela duraria cerca de um mês, mas na segunda-feira (28), o chefe da assessoria militar da Secretaria, Pedro Luis de Souza Lopes, afirmou que ela continua por tempo indeterminado. Até o momento, 24 pessoas morreram.

A SSP informou, por meio de nota, que as mortes decorrentes de intervenção policial estão sob investigação do Deic de Santos, com apoio do DHPP, e que todas as 24 foram resultados de confrontos.

“Todos os casos de mortes decorrentes de intervenção policial (MDIP) estão em investigação pela Deic de Santos, com o apoio do DHPP, e pela Polícia Militar. O conjunto probatório apurado no curso das investigações, incluindo as imagens das câmeras corporais, tem sido compartilhado com o Ministério Público e o Poder Judiciário. Em 24 abordagens os suspeitos entraram em confronto com as forças policiais e acabaram morrendo baleados.

Os laudos oficiais de todas as mortes, elaborados pelo Instituto Médico Legal (IML), foram executados com rigor técnico, isenção e nos termos da Lei. Em nenhum deles foi registrado sinais de tortura ou qualquer incompatibilidade com os episódios relatados. Os documentos já foram enviados às autoridades responsáveis pelas investigações.

A Secretaria da Segurança Pública informa que a Operação Escudo segue em curso para sufocar o tráfico de drogas e combater o crime organizado na Baixada Santista. Desde o início, em 28 de julho, até esta quinta-feira (31) as forças policiais prenderam 747 pessoas, das quais 291 eram foragidas da Justiça pelos mais diversos crimes, como roubo, sequestro e homicídio. Foram apreendidos 934,3 kg de entorpecentes – causando um prejuízo ao tráfico que passa dos R$ 2 milhões – e 94 armas que estavam na mão de criminosos, recolhidas.

Desvios de conduta não são tolerados e são rigorosamente apurados mediante procedimento próprio. A pasta ressalta que até o momento nenhuma denúncia de abuso durante a operação foi registrada. Denúncias podem ser formalizadas em qualquer unidade da Polícia Militar, inclusive pela Corregedoria da Instituição.”

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) reuniu ao menos 11 relatos de violações dos direitos humanos durante a Operação Escudo.

Com isso, o órgão recomendou ao governo de São Paulo, sob a gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos), que se encerre a operação e apresente, em até 20 dias, esclarecimentos sobre as circunstâncias das mortes em decorrência da intervenção policial.

“A primeira recomendação é a interrupção imediata da Operação Escudo. Já são mais de 30 dias, mortos, resultados que não demostram eficiência na própria operação. Precisamos que parentes das vítimas recebam tratamento psicológico. Vimos aqui situação de ansiedade, depressão de algumas pessoas que estão, inclusive, sendo atingidas indiretamente pela operação. Pessoas absolutamente inocentes, crianças em suas creches, mães que vão deixar suas crianças nas suas creches ou que não podem deixar em razão da operação”, disse André Leão, presidente do CNDH.

Veja as recomendações do CNDH ao governo de São Paulo:

Interromper imediatamente a Operação Escudo, considerando o decurso de mais de 30 dias da operação, a intolerável taxa de letalidade e os relatos de violações de direitos humanos;
Apresentar, em até 20 dias, plano de ação da Operação Escudo, com esclarecimentos sobre as circunstâncias das mortes de civis em decorrência da intervenção policial;
Apresentar, em até 20 dias, relatório detalhado de cada dia da Operação Escudo, contendo informações sobre objetivos, horários, comandantes, batalhões e CIA, armamentos utilizados, vítimas, detidos e outras informações relevantes
Fornecer, no prazo máximo de 20 dias, a cadeia de custódia das câmeras de todos os policiais envolvidos na operação, abrangendo o dispositivo físico, informações coletadas, armazenamento, arquivamento, downloads e qualquer outra informação relevante para o resguardo das filmagens.
Fornecer, no prazo máximo de 20 dias, explicações sobre a não utilização de câmeras corporais por policiais alocados em batalhões que compõem o Programa Olho Vivo.
Investigar, em regime de urgência, os crimes de ameaça praticados contra o Ouvidor da Polícia do estado de São Paulo, fornecendo, no prazo de 15 dias, informações sobre o resultado desses inquéritos;
Garantir medidas de segurança, com escolta 24horas por dia, e condições de trabalho adequadas ao Ouvidor das Polícias para que ele possa continuar a conduzir seu trabalho de maneira eficaz e segura;
Cumprir o disposto no art. 2º, VI, da Lei Complementar do estado de São Paulo nº 836/97, garantindo o fornecimento imediato das informações requisitadas pelo Ouvidor da Polícia do estado de São Paulo, especialmente as imagens das câmeras corporais usadas por policiais;
Realizar a investigação das mortes em decorrência de intervenção policial de maneira transparente e independente, com a participação de órgãos externos, familiares das vítimas e entidades de direitos humanos, a fim de assegurar imparcialidade e eficácia nas apurações, seguindo padrões internacionais como o Protocolo de Minnesota, apoiando também as investigações do Ministério Público;
Assegurar a autonomia da perícia técnico-científica para atuar de maneira imparcial em todos os casos de denúncias de violações de direitos humanos apresentados como decorrência da Operação Escudo;
Garantir proteção e amparo socioassistencial do Estado às testemunhas e familiares das vítimas, assegurando sua segurança contra represálias ou ameaças e facilitando seu acesso ao devido processo legal
Garantir o uso obrigatório de câmeras corporais por todos os agentes envolvidos em outras operações policiais, particularmente nos Batalhões de Ações Especiais da Polícia (BAEP), assegurando o registro de suas condutas;
Assegurar, nos casos de operações policiais que resultem em violação à integridade física de civis, acesso imediato às imagens ao Ministério Público, à Defensoria Pública, à Ouvidoria das Polícias e aos demais órgãos de controle;
Apresentar, em 20 dias, protocolo detalhado para o uso de equipamentos especiais em operações policiais em áreas sensíveis, com ênfase na segurança das/os cidadãs(ãos);
Apresentar, em 20 dias, protocolos de segurança para evitar operações em áreas sensíveis como escolas e instituições de saúde, preservando o bem-estar da comunidade;
Garantir a presença obrigatória de socorristas e ambulâncias nas operações, para atender a eventualidades e prestar socorro adequado às vítimas;
Apresentar, em até 20 dias, plano de medidas específicas para proteger grupos vulneráveis, evitando a vitimização desproporcional de crianças, adolescentes, pessoas negras e minorias;
Garantir reparação integral às famílias das vítimas, incluindo restituição, indenização, reabilitação e medidas de não repetição;
Reconhecer as violações de direitos humanos ocorridas durante a chacina e emitir, em até 20 dias, um pedido público de desculpas às vítimas e a seus familiares

By Alessandra Gomes

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